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Um sonho de infância com obstáculos de gente grande

  • Willian Bruno
  • 30 de nov. de 2016
  • 6 min de leitura

Segundo a Confederação Brasileira de Futebol, 82% dos jogadores, ganham até mil reais. Algo totalmente diferente do imaginado por muitas crianças, que sonham com a profissão.

Foto: Crianças no treinamento da base do Paraná Clube. Créditos: Luis Felipe Sanzovo

Futebol. Diga esta palavra próximo a um garoto ou garota em seu bairro, na sua rua ou até mesmo na sua casa e veja como reagirá. Caso a reação seja um olhar brilhante, um pulo de alegria em mencionar o esporte mais amado por brasileiros, ou falas sobre a chance de poder crescer na vida e ser famoso, pode ser que essa criança ou adolescente queira ser um atleta profissional.


Muitos desses jovens enxergam no esporte a oportunidade de realizar o sonho de praticar a atividade favorita juntamente com a possibilidade (ou ilusão) de receber a “fortuna” que os principais atletas do país e do mundo recebem atualmente. Dessa maneira, eles podem melhorar a vida da família com um trabalho satisfatório e totalmente reconhecido pela sociedade, já que a imagem do profissional de futebol é uma das mais valorizadas - por conta da forte cultura que há, especialmente no Brasil, em reverenciar o futebol. No entanto um dado da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), mostra uma realidade diferente. 82% dos jogadores de futebol, recebem até mil reais.

Foto: Treinamento do time Sub-14 do Paraná Clube. Créditos: Luis Felipe Sanzovo

Quando os pais reconhecem que a criança tem interesse mútuo na prática esportiva ou percebem que o jovem tem algum talento na realização do esporte, tendem a levá-los a exercitar as atividades em um nível mais avançado. Um dos caminhos mais buscados são as chamadas escolinhas de futebol.


Lá dentro a criança começa a descobrir verdadeiramente o universo do futebol, mesmo que seja “precária” a fundamentação do esporte naquela instituição. Muitas escolinhas espalhadas na capital paranaense são licenciadas pelos principais clubes do estado e do país.

Foto: Um dos treinamentos realizados no local. Créditos: Luis Felipe Sanzovo


As instruções dadas aos praticantes são feitas por profissionais que visam potencializar a capacitação do atleta na prática esportiva, como também, para obter lucros. Quando se é diagnosticado que um dos participantes tem um destaque na produtividade atlética, é comum se lançar a expectativa: “ele tem jeito para isso”, “pode se tornar jogador”, “podemos investir nele”.


Nesse início, o quesito empolgação faz com que os pais ou responsáveis criem um laço emocional, que desperta a esperança e a maior atenção na prosperidade da vida esportiva do jovem. Isso mexe tanto com o psicológico do adulto quanto com o da criança. A partir das decisões tomadas de ambas as partes é que surgem algumas reações decisivas.

Foto: Atletas fazendo trabalho tático. Crédito: Luis Felipe Sanzovo

Impactos psicológicos

William Corrêa é psicólogo esportista do Paraná Clube, onde trabalha com o elenco principal e também auxilia na coordenação da categoria de base chamada de Ninho da Gralha. Ele explica que um dos princípios que devem ser abordados é de que antes de se formar um atleta, tem de se formar um grande ser humano. “Isto é bom para a construção dele referente a uma sociedade no qual ele vai ser inserido posteriormente”, afirma.


Mas com isso chegamos a uma questão: por que existe a pressão para que esses possíveis atletas sejam profissionais bem-sucedidos com tão pouca idade? As respostas podem ser as mais diversificadas dentro do mundo do futebol, mas alguns aspectos que chamam mais a atenção. Um deles é o anseio familiar, ambiente onde a pressão que passa a existir a partir das angústias dos pais ou responsáveis.


Foto: Infográfico com os fatores relacionados ao caminho da base ao sonho de ser jogador profissional. Crédito: Luis Felipe Sanzovo


Crianças e Família: ajuda ou cobrança

Guilherme Marcos tem apenas 13 anos de idade e já está presente em uma categoria de base há mais de três anos seguidos. A posição em que atua é, no jargão do futebol, uma das mais ingratas: goleiro. Ele conta que é uma espécie de tradição familiar: os meninos que gostam de futebol na casa dele sempre escolhem a posição. “Meu pai jogou no gol antigamente, mas não chegou a se profissionalizar. Ele aprendeu tudo com meu avô, que também foi goleiro. Ambos estão me ajudando muito para eu conseguir esse sonho para família”, diz.


Com um discurso bem semelhante ao de um veterano de um grande clube, que podemos ver nas entrevistas do pós-jogo da rodada do brasileirão, transmitidos na tevê aberta, Guilherme - na plenitude dos seus consideráveis 13 anos -, afirma com ênfase que “o que mais ajuda na construção da carreira profissional dentro do futebol é o apoio familiar, pois é quem vive contigo todos os dias e tem mesma ambição, é quem te motiva a seguir em frente”.

Foto: Guilherme durante o treino de goleiros. Crédito: Luis Felipe Sanzovo

O psicólogo William avalia que a postura dos familiares pode beneficiar muito, e prejudicar na mesma proporção, o desempenho do atleta jovem na equipe. Ele relata que um dos principais motivos de estresse causado durante as partidas é por conta da cobrança que vem de casa. “Já vi e ouvi de muitos atletas que os pais vêm cobrando resultados dobrados deles. Aí não tem erro! Os meninos não suportam. Cobrança da família é algo redobrado”, comenta.


A frustação antiga por não ter conseguido o sucesso almejado é uma outra forma de pressão elaborada por familiares próximos aos atletas. Isso gera uma transferência de responsabilidade que afeta diretamente no resultado. “Às vezes o pai não conseguiu ser um jogador de sucesso, ou mesmo nem em peneiras passou, mas exerce no filho a oportunidade que ele não conseguiu. Com isso o menino vem com peso dois”, completa o psicólogo. Traduzindo na boleragem, ele está fazendo o papel do volante de contensão (camisa 5 ou 42, dependendo se você gosta do futebol moderno, ou não): carrega o piano nas costas e vai lavando a roupa suja. Isso para um menino de 13, 15, 17 anos, chega a ser um absurdo.


Vídeo: Reportagem sobre como funciona o processo de profissionalização de um jogador. Destacando a etapa nas categorias de base e os fatores fora e dentro de campo que interferem nas crianças e adolescentes. Crédito: Willian Bruno


O papel do empresário


O outro fator está ligado a quem orienta os passos mais importantes da caminhada dessa criança ou adolescente em busca do sonho de ser um jogador profissional. Esse papel pode ser feito por olheiros, comissão técnica e até mesmo o “temido” empresário.


Os fomentadores de opiniões sobre as partes técnicas dos atletas são o que mais estão perto da realidade em que o mercado de trabalho futebolista oferece. Muitas das vezes, os orientadores destes meninos e meninas, que sonham ser jogadores, são recém-chegados da profissão. São muitos ex-atletas que buscam continuar no ramo para se estabelecer financeiramente ou buscar uma nova experiência.

Foto: Allexson Bryan, jogador profissional do Paraná Clube é orientado por um empresário e passou pelas situações que atletas da base passam. Crédito: Luis Felipe Sanzovo


Um dos primeiros contatos com essas pessoas acontece quando o atleta se destaca em uma categoria e ouve os diversos elogios da comissão técnica. Se mantiver a pegada e a produção aumentar, ele sobe a mais uma categoria e vai se aproximando do profissional gradativamente.


Cada vez ele vai aumentando seu status. Até que “explode” dentro da categoria em que ele se destaca muito. Chega então a presença do empresário. Empresário, na gíria do futebol, é uma figura de suma importância no crescimento do jogador. É tido como o grande companheiro na vida profissional do boleiro, mas sempre pendendo para os assuntos econômicos.

Foto: William Corrêa explicou sobre os fatores que envolvem a carreira de um jogador de base. Crédito: Luis Felipe Sanzovo


As principais transações do mercado da bola brasileiro e mundial só acontecem graças os empresários. Isso é fato. Mas desde quando a presença desse “companheiro” é válida em decisões na vida do atleta? Será que é realmente necessário esse personagem ser acionado em toda pauta na carreira do jogador?


Rafael de Souza é um dos principais membros da comissão técnica de categorias de base de um clube da capital paranaense. Formado em Educação Física e tendo experiência como atleta de base, ele passa aos seus comandados as formas em que acha mais beneficente para que possam ter aptidão nos treinamentos.


A categoria que ele estabelece orientações é do sub 13 e 15. Já nessa fase, ele percebe algumas interferências extra campo que, muitas vezes, prejudicam o futuro de vários atletas. “Alguns não sabem esperar o tempo adequado para ter a oportunidade no time. Muitos saem achando que, por não jogarem, já estão fora. Eles saem e vão para outros clubes tentarem testes porque acham estão prontos”, diz Rafael. “Nós trabalhamos com o processo de maturação, onde desenvolvemos a capacidade física e mental. Gradativamente o atleta evolui, tanto aqui quanto na sociedade, assim não queima etapas. Mas algumas interferências fora do gramado fazem com que eles pensem que não vou chegar no seu tempo e acabam se frustrando, e até mesmo chegando a desistência do sonho”, lamenta.


Foto: Rafael de Souza após o treinamento de goleiros. Crédito: Luis Felipe Sanzovo


A expectativa pela ascensão rápida na categoria de base faz também com que o atleta se sinta pressionado a desenvolver seu melhor futebol. A mídia também teu seu papel de influenciar as escolhas dos times e gostos. A propaganda de que a execução da prática futebolista na Europa é melhor também está muito evidente, fazendo assim que o cenário nacional fique desvalorizado e o sonho do menino perca força.


A má gestão da maior entidade do futebol nacional é outro agravante para essa situação. São pontos que prejudicam o andamento da produção de novos – e bons – talentos presentes em nosso solo. E o discurso que fica é aquele que arrebenta para o lado mais fraco: “a geração de jogadores que não é muito boa”. Será?



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